CÂNCER INFANTIL: BATALHA DE GENTE GRANDE
Por Marina Diniz, Juan Barreto, Clarice Rosane e Luísa Aguiar
Ao contrário do que popularmente se pensa, o câncer (Neoplasia Maligna) não é uma doença específica. Na verdade, o termo corresponde a uma característica em comum que mais de 200 doenças distintas apresentam: a proliferação anormal e descontrolada de células, capaz de comprometer qualquer parte do nosso organismo. O câncer infanto-juvenil, no entanto, é algo que deve ser analisado separadamente, pois ele acomete locais primários e manifesta origem e comportamento clínico diferentes daqueles observados nos seres humanos adultos.
Há uma tendência de que nos indivíduos essencialmente jovens a enfermidade seja de crescimento mais rápido e cause reações mais agressivas, porém responda melhor aos tratamentos. Isso se deve ao fato de que (embora produzidas de forma desequilibrada) essas células são de natureza embrionária e ainda sem função determinada no corpo, podendo ser mais facilmente eliminadas.
De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA), a maioria dos casos envolvendo crianças e adolescentes afeta as células do sistema sanguíneo e dos tecidos de sustentação. No quadro abaixo, podemos conferir as peculiaridades contidas nas três das principais patologias responsáveis por levar a óbito pessoas na faixa etária entre 1 e 19 anos no Brasil.
A rapidez na descoberta da doença é fundamental para que se consiga saná-la com êxito. Quanto mais em seu estágio inicial ela for detectada, maiores são as probabilidades de uma cura. De acordo com Socorro Andrade, enfermeira responsável pelo ambulatório de Oncologia Pediátrica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Cariri (Famed - UFCA), existe um aspecto que atrapalha o diagnóstico precoce de ser feito corretamente: os primeiros sinais de um câncer podem ser confundidos com sintomas de mazelas corriqueiras, pois são semelhantes. "A febre talvez seja apenas alguma infecção comum, dores nas articulações remetem à chamada 'dor do crescimento', uma mancha roxa pode ser interpretada como o resultado de uma simples pancada. A avaliação de um oncologista vai, antes de mais nada, tentar descartar um possível processo cancerígeno para depois cogitar ser outra coisa. É o inverso do que ocorre quando a consulta é com um clínico geral, por exemplo", afirma Socorro.
O combate a doença no Ceará
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Sem dados oficiais discriminados por estado, é possível estimar a taxa de incidência infanto-juvenil no Ceará com base no número de diagnósticos realizados pelo Centro Pediátrico do Câncer (CPC) em Fortaleza. Até o final do ano passado, 1.200 casos de suspeita de câncer em crianças e adolescentes foram contabilizados pelo Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS) onde funciona o CPC. Segundo Selma Lessa, coordenadora do Serviço de Oncohematologia do local, mais da metade desses atendimentos eram de pacientes oriundos de municípios do interior.
A imensa procura por tratamento na capital foi uma consequência direta do encerramento da ala Oncológica Pediátrica do Hospital e Maternidade São Vicente de Paulo (HMSVP) em Barbalha, região do Cariri, ainda no primeiro semestre de 2017. A direção se viu forçada a suspender as atividades nesse setor em decorrência de dificuldades financeiras. Com o tempo, o repasse de verbas realizado pelo Ministério da Saúde tornou-se insuficiente para suportar a demanda da zona Centro-Sul cearense e também a gerada pelos vizinhos Pernambuco, Paraíba e Piauí. Os critérios exigidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) como condição para aprovar a implementação de instalações exclusivas para esse tipo de tratamento são:
Cariri volta a disponibilizar tratamento gratuito
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Através de uma parceria com o Instituto de Apoio à Criança com Câncer (IACC), o Hospital e Maternidade São Vicente de Paulo pode reabrir no dia 06 de junho de 2019 sua ala de oncologia pediátrica após uma interrupção que durou dois anos e deixou muitos desamparados. Para receber a assistência necessária, algumas famílias chegavam a ter que percorrer mais de seiscentos quilômetros até Fortaleza. As extensas e constantes viagens desgastavam ainda mais aqueles que já se encontravam com a saúde debilitada. Graças ao trabalho realizado em conjunto pelas duas instituições, a questão do deslocamento foi resolvida.
A criança que padece dessa enfermidade sofre um abalo físico/emocional muito intenso ao ser privada de sua rotina normal de estudo e lazer para se submeter a internações e seus efeitos colaterais desagradáveis (advindos do próprio medicamento). Afastá-la também do convívio de seu núcleo familiar, fazendo com que ela precise buscar acompanhamento profissional em uma cidade estranha e longínqua é ainda mais problemático. Almicar Leite (assessor administrativo do Hospital São Vicente de Paulo) e Fátima Regina Pontes (diretora do IACC) comentam sobre a importância dessa ação coletiva para os moradores da região do Cariri e adjacências.
Reinauguração da Oncologia Pediátrica (Imagem: perfil do IACC no Instagram)
Superando períodos difíceis
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Mesmo quando os pequenos ainda não entendem bem o que está acontecendo, eles sentem que existe algo errado. Observam o comportamento das pessoas próximas e percebem que está diferente. Por isso, os pais precisam demonstrar serenidade para transmitir confiança aos jovens. "É preciso tentar manter a calma. Lembrar que é uma fase muito ruim, mas que vai passar. Não pode entrar em desespero e achar que a vida acabou. Nem nos momentos mais tensos eu perdi o equilíbrio, porque senão esse nervosismo contagia todo mundo e prejudica a recuperação dele", declarou a costureira Lúcia Salustino, mãe de um garotinho em tratamento.
Sobre a doação de cabelos para a confecção de perucas, medida adotada por algumas Organizações Não Governamentais (ONG's) visando elevar a autoestima dos pacientes com câncer, cujo efeito colateral dos remédios é a queda dos cabelos, é essencial para contornar os momentos de crise e renovar seu bem-estar. Danilo Campos, voluntário há dois anos no IACC, explica que as crianças são mais espontâneas: "Eu vejo que elas no máximo usam uma bandana ou boné, às vezes uma fitinha com lacinho quando o clima está mais quente. Mas em geral, se sentem bem mais livres carequinhas mesmo", informa Danilo e completa dizendo que a procura por artifícios como perucas e turbantes parte dos adolescentes, que por conta da idade, naturalmente se preocupam mais com a vaidade.
Pacientes infantis da ala Oncológica Pediátrica do Hospital São Vicente de Paulo em um momento de descontração
Em suma, as crianças que fazem parte do tratamento contra o câncer ganham uma nova oportunidade de viver e ver seus sonhos sendo realizados e as chances de ter a cura com família próxima e com profissionais não somente qualificados como também pessoas de bom coração, aumenta as expectativas dos pequenos e a alegria de viver renasce com a nova vida após o tratamento.